Condenação histórica do Google nos EUA: especialistas apontam impactos globais e possíveis desdobramentos

Sentença que reconhece práticas monopolistas no mercado de publicidade digital reacende debates sobre concorrência, jornalismo e o futuro da economia digital

Condenação histórica do Google nos EUA: especialistas apontam impactos globais e possíveis desdobramentos
Decisão contra o Google representa mais um capítulo em uma série de processos antitruste. Créditos: pexels.

O Google enfrenta um dos maiores desafios jurídicos de sua história após ser condenado por práticas monopolistas no mercado de publicidade digital nos Estados Unidos.

A decisão contra o Google representa mais um capítulo em uma série de processos antitruste que a empresa enfrenta em várias partes do mundo.

O cerco contra práticas monopolistas vem se intensificando nos últimos anos, especialmente no setor de publicidade e buscas online.

Recentemente, também noticiamos aqui no SEO Lab o processo bilionário que o Google enfrenta no Reino Unido por suposto abuso de poder em buscas. Você pode saber mais sobre esse caso nesta matéria.

Além disso, destacamos a condenação da empresa nos Estados Unidos por operar monopólios ilegais no mercado de anúncios digitais, como mostramos neste outro conteúdo.

Especialistas analisam as consequências

A decisão já gera intensos debates entre especialistas em tecnologia, publicidade e direito.

Stacy Mitchell, codiretora do Institute for Local Self-Reliance, avalia que a condenação é significativa para a democracia:

“O controle do Google sobre o fluxo de informações e sua capacidade de atrair receitas publicitárias têm sufocado veículos de notícias locais e enfraquecido um dos pilares da democracia.”

Jason Kint, CEO da associação Digital Content Next, vê a sentença como um passo importante para restaurar a concorrência:

“O Google privou editores em todo o mundo de receitas cruciais, comprometendo sua capacidade de sustentar jornalismo e entretenimento de qualidade.”

Ainda assim, há incertezas sobre o impacto imediato para os usuários. Para Anupam Chander, consultor do Instituto de Direito e Política Tecnológica da Universidade Georgetown:

“O mercado de publicidade digital é tão complexo que é difícil prever como mudanças nas operações do Google vão afetar os usuários.”

Chander também ressalta que uma maior abertura do mercado pode trazer consequências inesperadas, como o aumento da coleta de dados por outros concorrentes que tentem se firmar frente ao novo cenário.

No Brasil, o professor Nicolo Zingale, da FGV Direito Rio, explicou à Folha de S.Paulo que decisões sobre remédios antitruste levam em conta não apenas o problema atual, mas também o histórico de cumprimento de regras pela empresa:

“As decisões sobre o tipo de remédio adotado [para resolver questões de concorrência] focam na causa do problema e podem considerar eventualmente o histórico da empresa para checar a credibilidade no cumprimento de compromissos anteriores.”

Zingale destacou, no entanto, que a abordagem tradicional desses julgamentos tende a analisar apenas o mercado específico afetado, o que dificulta uma avaliação mais ampla do comportamento do Google em todo o ecossistema digital.

Além disso, o jornalista e colunista Pedro Doria, diretor de jornalismo do Meio, aponta que o domínio do Google não é apenas fruto de práticas comerciais, mas também de um efeito de retroalimentação baseado no volume de uso:

“Algoritmos de busca não se tornam melhores porque um programador tem mais talento do que o concorrente. O que pesa, como em quaisquer algoritmos de inteligência artificial, é o volume de dados que alimenta o bicho. Ou seja, quanto mais gente usa um site de busca, melhor ele fica. O Google é melhor por ser muito mais usado do que os outros. E é mais usado porque paga para dificultar que as pessoas mudem.”

Essa combinação de fatores mostra como a discussão sobre práticas anticompetitivas vai além das multas e condenações — ela toca na estrutura fundamental do funcionamento das plataformas digitais.

Entenda o caso: o que está em jogo?

As acusações contra o Google têm base na legislação antitruste dos EUA, conhecida como Sherman Act, criada para proteger o livre mercado e combater monopólios. Esta é a lei antitruste mais antiga dos EUA.

O resumo do caso é o seguinte:

  • Em 2020, o Google foi acusado de violar as leis antitruste;
  • O governo dos EUA afirmou que a empresa exerce monopólio tanto em pesquisas online quanto em anúncios baseados em busca;
  • O julgamento começou em 2023 e terminou em 5 de agosto de 2024;
  • O veredito concluiu que o Google não só domina o mercado, como também atua para reforçar sua posição com contratos bilionários com outras gigantes da tecnologia.

O que diz a condenação e como o Google respondeu

Na última sexta-feira (18), em outra ação movida pelo Departamento de Justiça dos EUA, uma juíza federal determinou que o Google mantém um monopólio no mercado de publicidade online.

A sentença, foi emitida por um tribunal federal dos EUA e considerou que o Google violou as seções 1 e 2 da legislação antitruste no setor de ad exchanges (plataformas de compra e venda de espaços publicitários) e ferramentas de publicidade.

A juíza Leonie Brinkema destacou que a conduta "excludente" da empresa prejudicou editores, reduziu a concorrência e afetou consumidores.

No entanto, a corte não considerou que o Google detenha monopólio sobre redes de anúncios como um todo.

O Google, por sua vez, já indicou que pretende recorrer da decisão. A vice-presidente de assuntos regulatórios, Lee-Anne Mulholland, declarou:

“Vencemos metade do caso e vamos apelar da outra metade.”

Essa resposta reitera a postura da empresa diante de outros processos semelhantes, como o julgamento antitruste que sugeriu a separação do Chrome.

Europa pode endurecer mais do que os EUA

Além dos EUA, a União Europeia também avança em sua investigação sobre o domínio do Google no mercado de tecnologia para publicidade.

Alguns analistas acreditam que o bloco europeu poderá ser ainda mais rigoroso.

O advogado Stephen Kinsella destaca:

“Depois de anos aplicando multas que a empresa tratou como custo operacional, a Comissão Europeia tem agora a chance de romper esse ciclo ineficaz. Chegou a hora de restaurar uma economia digital vibrante, competitiva e justa – uma economia que funcione para os cidadãos, e não para monopólios consolidados.”

LEIA TAMBÉM: Nova lei digital do Reino Unido acende alerta nos EUA sobre possível censura

O que esperar a partir de agora?

A condenação do Google pode abrir caminho para transformações profundas no mercado de publicidade digital — e marcar um divisor de águas na regulação das grandes plataformas tecnológicas.

Enquanto o Google já se prepara para recorrer da decisão, outras jurisdições, como a União Europeia, sinalizam uma postura ainda mais firme em relação ao domínio das big techs.

O cenário ainda é incerto, mas uma coisa é clara: o debate sobre o impacto das gigantes da tecnologia no mercado global está longe de terminar.

Aliás, os movimentos de concorrentes também merecem atenção. Como mostramos em outra matéria da SEO Lab, a OpenAI — desenvolvedora do ChatGPT — demonstrou interesse na compra do Chrome, o que reforça como as disputas pelo controle da navegação e da publicidade digital estão apenas começando.

LEIA TAMBÉM: Se a OpenAI comprar o Chrome, a IA pode dominar a guerra dos navegadores

*Com informações do Fast Company Brasil.